quarta-feira, 17 de setembro de 2014

Vai viajar e tem medo do ebola? Chances de contágio são baixas, e água e sabão podem ajudar




Altamente mortal e praticamente isolado no continente africano, o vírus ebola ainda levanta muitas dúvidas sobre a forma de contaminação e as chances de um surto mundial. Afinal, existe a possibilidade de um brasileiro se contaminar durante uma viagem ao exterior, mesmo sem ir à África, e trazer o vírus para o Brasil?
"Eu estou muito tranquilo quanto a isso. Acho realmente muito difícil de acontecer", garante Atila Iamarino, doutor em microbiologia pela Universidade Yale, nos EUA. Ele explica que, para que uma pessoa seja contaminada pelo vírus, é preciso que ela entre em contato com os fluidos contaminados de outra pessoa.
"Precisa haver um contato muito intenso. O que se observou sobre este surto que está ocorrendo na África é que cerca de 60% dos casos ocorreram por causa dos rituais funerários típicos da região. As pessoas precisam limpar os corpos dos parentes para o enterro e, para isso, entram em contato com o intestino e com o sangue do morto", explica Iamarino.
Apesar de a chance ser pequena, o especialista concorda que é quase impossível impedir que o vírus saia da região. "Fechar as fronteiras pode retardar em alguns dias ou semanas a chance de o vírus deixar um dos países de outra forma, mas não impedir", alerta o especialista. Atualmente, o surto de ebola está focado principalmente em Guiné, Libéria e Serra Leoa, além de alguns casos no Congo e na Nigéria. 
Ainda assim, há outros fatores que diminuem a chance de o vírus chegar ao Brasil. "O país não tem e nunca teve voos diretos para esta região contaminada. Se afetar países mais populosos, o que pode acontecer, a chance de se espalhar fica dependendo da estrutura local de impedir a disseminação do vírus", afirma Jessé Alves Reis, doutor infectologista do hospital Emílio Ribas, em São Paulo, e Coordenador do Núcleo de Medicina do Viajante.
Além disso, como existe um abismo estrutural entre os hospitais que atualmente atendem os infectados pelo vírus na África e os centros hospitalares de países mais desenvolvidos, como o Brasil, a tendência é que a situação seja mais grave nessas localidades mais precárias.

Vou viajar; consigo me prevenir?
Durante a conversa com os especialistas, a reportagem do BOL debateu três possíveis casos de contato com pessoas contaminadas.
Primeiramente, é preciso deixar claro que a chance de uma pessoa ser contaminada por alguém que tem o vírus no organismo, mas não manifestou nenhum sintoma, é quase zero. "Até onde se sabe, o ebola não se transmite na fase de incubação. Em geral, ele não tem quantidade de vírus suficiente para poder passar para outras pessoas", explica o infectologista do hospital Emílio Ribas.
No entanto, se considerarmos que uma pessoa pode embarcar no avião sem sintomas, mas passar a apresentá-los durante a viagem, ela colocaria todos os outros passageiros em risco? "A doença não é transmitida pelo ar. Então, se você não teve contato com suor, vômito, sangue ou qualquer secreção da pessoa, não há grande risco", explica Atila Iamarino. Mesmo que você passe dias no mesmo local que alguém contaminado, se não houver contato com alguma secreção, não há como haver contágio.
Além disso, a infectologista Marília Santini, especialista do Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI/FioCruz), do Rio de Janeiro, relembra que há um kit de emergência dentro de aviões das principais companhias aéreas, podendo ser manipulado por algum médico presente na aeronave. "Há luvas, máscaras, avental e outras coisas mais. Não é o ideal, mas pode ser o suficiente para um médico fazer a intervenção inicial", explica a especialista.

Outro caso de possível contaminação seria em aeroportos, onde a circulação é muito grande. Nessa situação, o melhor a fazer é evitar o contato direto com a pessoa que apresente os sintomas e procurar a ajuda de um médico imediatamente. "Na dúvida, não toque em uma pessoa com os sintomas", afirma o microbiologista Atila Iamarino.
No mais perigoso dos casos, se você pretende visitar um dos países africanos que estão no centro do contágio do ebola ou muito próximo, a principal dica é simples. "A higiene ainda é a melhor forma de se evitar qualquer contaminação. A melhor maneira de eliminar germes é sabão e água corrente", afirma Marília Santini. 
A fórmula também é apoiada pelo colega de profissão. "Se você está indo para um lugar com risco em potencial, é bom fazer a higiene das mãos com frequência. Antes de comer, e antes e depois de ir ao banheiro", diz Reis.
"Qualquer contato com as mucosas tem risco. Tudo isso é um cuidado, mas a chance de um contágio por contato fortuito é muito remota", complementa.
Uma opção mais rápida, para situações em que a pessoa não pode lavar as mão apropriadamente, seria utilizar o bom e velho tubinho de álcool em gel, que muitas vezes é a única opção de médicos em hospitais quase sem nenhuma estrutura de países afetados pelo vírus.
Em resumo, é impossível dizer que a chance de se contaminar com o ebola durante uma viagem de avião seja nula, mas ela é muito remota, e alguns cuidados básicos de higiene fazem uma grande 
diferença.


Entenda o ebola
  • O que é o ebola?
    O ebola é uma doença causada por vírus que pode ser fatal em até 90% dos casos. A morte geralmente ocorre por falhas renais e problemas de coagulação, em até duas semanas após a aparição dos primeiros sintomas.
  • Como se contrai o vírus?
    O ebola é transmitido pelo contato direto e intenso com sangue e fluidos corporais (como suor, urina, fezes e sêmen, por exemplo) de pessoas contaminadas e de tecidos de animais infectados. Até o momento, não há notícias de pessoas que transmitiram o vírus antes de apresentarem os sintomas.
  • Quais os sintomas mais comuns?
    Os principais sintomas são febre repentina, fraqueza, dor muscular, dores de cabeça e inflamação na garganta. Seguidos de vômitos, diarreia, coceiras, deficiências hepáticas e renais e, em alguns casos, hemorragias internas e externas. O período de incubação costuma ser de dois a 21 dias, ou seja, esse é o período de tempo que pode levar para a pessoa infectada começar a apresentar os sintomas.
  • Quais países têm mais casos de ebola?
    Guiné, Libéria e Serra Leoa vivem surtos de ebola, e há casos na Nigéria e no Congo. EUA, Espanha e Reino Unido levaram compatriotas infectados para tratamento em seus países.
  • O ebola tem tratamento específico?
    Não. Em geral os médicos recorrem a medicamentos para aliviar os sintomas, mas a cura depende do organismo do paciente. Existem apenas remédios e vacinas experimentais sendo testados no Canadá e nos EUA. O Zmapp está sendo publicado no meio científico desde 2012, mas foi usado em humanos pela 1ª vez no surto atual, já que a OMS só libera o uso de medicamentos de alto risco em situações extremas.
Fonte: Ministério da Saúde, Médicos Sem Fronteias e entrevista com o doutor em microbiologia Atila Iamarino
Preconceito
O Hospital Emílio Ribas, em São Paulo, é referência em doenças infecto-contagiosas e, além de fazer um trabalho de preparo para a possível chegada do ebola ao país, leva esclarecimento a ONGs que atendem refugiados vindos de países africanos e que chegam ao Brasil sem nenhuma estrutura. "Nós decidimos fazer uma palestra para essas organizações para diminuir preconceito, e evitar o pânico e outras coisas que essa situação pode gerar", explica o médico infectologista Jessé Alves Reis.
Ele esclarece que é preciso saber detalhes da viagem, origem da pessoa, e se ela está dentro do período de incubação. "Para o indivíduo, seria uma situação muito complicada. Ele seria internado, isolado e ficaria em observação. Imagina fazer isso em um caso que não é de ebola", explica. De acordo com o especialista, um caso muito mais comum de uma pessoa com febre alta vinda da África é malária. "É muito mais frequente e mata muito mais lá na África do que o ebola", conclui o médico . Por isso, o amplo conhecimento sobre o vírus é decisivo para evitar ações motivadas pelo pânico.
Surto de ebola em números
2.400 mortes
Este é o número de casos fatais contabilizados pela OMS até o dia 12 de setembro de 2014 na África
20 mil contaminados
Segundo a OMS, este deve ser o número total de contaminados até o surto ser controlado, o que ainda não se sabe quando ocorrerá.

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